segunda-feira, abril 30, 2007

Declara Sua Renda


Há mais ou menos um ano, conheci este texto que me encantou. É a página 65 do livro “Cadeira de Balanço” de Carlos Drummond de Andrade. Sendo hoje é o último dia para declarações de renda, quem sabe, assim como o poeta, nos descobrimos sonegadores e resolvemos declarar rendimentos de bens de que tenhamos a posse, como se nos pertencessem? Eu posso declarar o prazer de ouvir uma orquestra de passarinho, de desenhar caras conhecidas em gordas nuvens brancas, de sentir o cheiro de manjericão colhido do meu jardim, de andar por aí, de ver, de ter faro pra distinguir o que vale a pena do que tenta parecer que vale. Em qual rubrica? Que tal Bens Incalculáveis?.


Declara Sua Renda
(Carlos Drummond de Andrade)



Sr. Diretor do Imposto de Renda:


O senhor me perdoe se venho molestá-lo. Não é consulta: é caso de consciência. Considerando o formulário para declaração de imposto de renda algo assimilável aos textos em caracteres cuneiformes, sempre me abstive religiosamente de preenchê-lo. Apenas dato e assino, entregando-o, imaculado como uma virgem, a um funcionário benévolo, a quem solicito: “Bote aí o que quiser”. Ele me encara, vê que não sou nenhum tubarão, rabisca uns números razoáveis, faz umas contas, conclui: “É tanto”. Pago, e vivemos in love, o Fisco e eu. Mas este ano ocorreu-me uma dúvida, a primeira até hoje, em matéria de renda e de imposto devido. O bom funcionário não soube resolvê-la, ninguém na repartição o soube.
Minha dúvida, meu problema, Sr. Diretor, consiste na desconfiança de que sou, tenho sido a vida inteira um sonegador do Imposto de Renda. Involuntário, inconsciente, mas de qualquer forma sonegador. Posso alegar em minha defesa muita coisa: a legislação, embora profusa e até florestal, é omissa ou não explícita; os itens das diferentes cédulas não prevêem o caso; o órgão fiscalizador jamais cogitou disso; todo mundo está nas mesmas condições que eu, e ninguém se acusa ou reclama contra si mesmo. Contudo, não me conformo, e venho expor-lhe lealmente as minhas rendas ocultas.
A lei manda cobrar imposto a quem tenha renda líquida superior a determinada importância; parece claro que só tributam rendimentos em dinheiro. A seguir, entretanto, a mesma lei declara: “São também contribuintes as pessoas físicas que perceberem rendimentos de bens de que tenham a posse, como se lhes pertencessem.” E aqui me vejo enquadrado e faltoso. Tenho a posse de inúmeros bens que não me pertencem e que desfruto copiosamente. Eles me rendem o máximo, e nunca fiz constar de minha declaração tais rendimentos.
Esses bens são: o Sol, para começar do alto (só a temporada de praia, neste verão que acabou, foi uma renda fabulosa); a Lua, que, vista do terraço ou da calçada da Avenida Atlântica, diante do mar, me rendeu milhões de cruzeiros-sonho: as árvores do Passeio Público e do Campo de Santana, que alguém se esqueceu de cortar; a montanha, as crianças brincando no play-ground ou a caminho da escola; em particular, três meninos que vêm e vão pelo ar, tão moleques e tão rendosos para este coração; as mangas, os chocolates comidos contra prescrição médica, um ou outro uísque sorvido com amigos, com calma calmíssima; os ventos de três poetas, um francês, um português e um brasileiro; certos prazeres como andar por andar, ver figura em edições de arte, conversar sem sentido e sem cálculo, um filmezinho como Le petit poison rouge, em que o gato salva o peixe para ser gentil com o canário, indicando um caminho aos senhores da guerra fria; e isso e aquilo e tudo mais de alta rentabilidade... não em espécie.
Estes os meus verdadeiros rendimentos, senhor; salários e dividendos não computados na declaração. Agora estou confortado porque confessei; invente depressa uma rubrica para incluir esses lucros e taxe-me sem piedade. Multe, se for o caso; pagarei feliz. Atenciosas saudações.

sexta-feira, abril 27, 2007

O homem de cabeça de papelão

É um longo texto. Tome às colheradas. Pode ser colher de café , quantas vezes quiser...mas é muito bom aprender a usar a cabeça de papelão!
O homem de cabeça de papelão
João do Rio


No País que chamavam de Sol, apesar de chover, às vezes, semanas inteiras, vivia um homem de nome Antenor. Não era príncipe. Nem deputado. Nem rico. Nem jornalista. Absolutamente sem importância social.
O País do Sol, como em geral todos os países lendários, era o mais comum, o menos surpreendente em idéias e práticas. Os habitantes afluíam todos para a capital, composta de praças, ruas, jardins e avenidas, e tomavam todos os lugares e todas as possibilidades da vida dos que, por desventura, eram da capital. De modo que estes eram mendigos e parasitas, únicos meios de vida sem concorrência, isso mesmo com muitas restrições quanto ao parasitismo. Os prédios da capital, no centro elevavam aos ares alguns andares e a fortuna dos proprietários, nos subúrbios não passavam de um andar sem que por isso não enriquecessem os proprietários também. Havia milhares de automóveis à disparada pelas artérias matando gente para matar o tempo, cabarets fatigados, jornais, tramways, partidos nacionalistas, ausência de conservadores, a Bolsa, o Governo, a Moda, e um aborrecimento integral. Enfim tudo quanto a cidade de fantasia pode almejar para ser igual a uma grande cidade com pretensões da América. E o povo que a habitava julgava-se, além de inteligente, possuidor de imenso bom senso. Bom senso! Se não fosse a capital do País do Sol, a cidade seria a capital do Bom Senso!
Precisamente por isso, Antenor, apesar de não ter importância alguma, era exceção mal vista. Esse rapaz, filho de boa família (tão boa que até tinha sentimentos), agira sempre em desacordo com a norma dos seus concidadãos.
Desde menino, a sua respeitável progenitora descobriu-lhe um defeito horrível: Antenor só dizia a verdade. Não a sua verdade, a verdade útil, mas a verdade verdadeira. Alarmada, a digna senhora pensou em tomar providências. Foi-lhe impossível. Antenor era diverso no modo de comer, na maneira de vestir, no jeito de andar, na expressão com que se dirigia aos outros. Enquanto usara calções, os amigos da família consideravam-no um enfant terrible, porque no País do Sol todos falavam francês com convicção, mesmo falando mal. Rapaz, entretanto, Antenor tornou-se alarmante. Entre outras coisas, Antenor pensava livremente por conta própria. Assim, a família via chegar Antenor como a própria revolução; os mestres indignavam-se porque ele aprendia ao contrario do que ensinavam; os amigos odiavam-no; os transeuntes, vendo-o passar, sorriam.
Uma só coisa descobriu a mãe de Antenor para não ser forçada a mandá-lo embora: Antenor nada do que fazia, fazia por mal. Ao contrário. Era escandalosamente, incompreensivelmente bom. Aliás, só para ela, para os olhos maternos. Porque quando Antenor resolveu arranjar trabalho para os mendigos e corria a bengala os parasitas na rua, ficou provado que Antenor era apenas doido furioso. Não só para as vítimas da sua bondade como para a esclarecida inteligência dos delegados de polícia a quem teve de explicar a sua caridade.
Com o fim de convencer Antenor de que devia seguir os tramitas legais de um jovem solar, isto é: ser bacharel e depois empregado público nacionalista, deixando à atividade da canalha estrangeira o resto, os interesses congregados da família em nome dos princípios organizaram vários meetings como aqueles que se fazem na inexistente democracia americana para provar que a chave abre portas e a faca serve para cortar o que é nosso para nós e o que é dos outros também para nós.
Antenor, diante da evidência, negou-se.
— Ouça! bradava o tio. Bacharel é o princípio de tudo. Não estude. Pouco importa! Mas seja bacharel! Bacharel você tem tudo nas mãos. Ao lado de um político-chefe, sabendo lisonjear, é a ascensão: deputado, ministro.
— Mas não quero ser nada disso.
— Então quer ser vagabundo?
— Quero trabalhar.
— Vem dar na mesma coisa. Vagabundo é um sujeito a quem faltam três coisas: dinheiro, prestígio e posição. Desde que você não as tem, mesmo trabalhando, é vagabundo.
— Eu não acho.
— É pior. É um tipo sem bom senso. É bolchevique.
Depois, trabalhar para os outros é uma ilusão. Você está inteiramente doido.
Antenor foi trabalhar, entretanto. E teve uma grande dificuldade para trabalhar. Pode-se dizer que a originalidade da sua vida era trabalhar para trabalhar. Acedendo ao pedido da respeitável senhora que era mãe de Antenor, Antenor passeou a sua má cabeça por várias casas de comércio, várias empresas industriais. Ao cabo de um ano, dois meses, estava na rua. Por que mandavam embora Antenor? Ele não tinha exigências, era honesto como a água, trabalhador, sincero, verdadeiro, cheio de idéias. Até alegre — qualidade raríssima no país onde o sol, a cerveja e a inveja faziam batalhões de biliosos tristes. Mas companheiros e patrões prevenidos, se a princípio declinavam hostilidades, dentro em pouco não o aturavam. Quando um companheiro não atura o outro, intriga-o. Quando um patrão não atura o empregado, despede-o. É a norma do País do Sol. Com Antenor depois de despedido, companheiros e patrões ainda por cima tomavam-lhe birra. Por que? É tão difícil saber a verdadeira razão por que um homem não suporta outro homem!
Um dos seus ex-companheiros explicou certa vez:
— É doido. Tem a mania de fazer mais que os outros.
Estraga a norma do serviço e acaba não sendo tolerado. Mau companheiro. E depois com ares...
O patrão do último estabelecimento de que saíra o rapaz respondeu à mãe de Antenor:
— A perigosa mania de seu filho é por em prática idéias que julga próprias.
— Prejudicou-lhe, Sr. Praxedes?
-Não. Mas podia prejudicar. Sempre altera o bom senso. Depois, mesmo que seu filho fosse águia, quem manda na minha casa sou eu.
No País do Sol o comércio é uma maçonaria. Antenor, com fama de perigoso, insuportável, desobediente, não pôde em breve obter emprego algum. Os patrões que mais tinham lucrado com as suas idéias eram os que mais falavam. Os companheiros que mais o haviam aproveitado tinham-lhe raiva. E se Antenor sentia a triste experiência do erro econômico no trabalho sem a norma, a praxe, no convívio social compreendia o desastre da verdade. Não o toleravam. Era-lhe impossível ter amigos, por muito tempo, porque esses só o eram enquanto. não o tinham explorado.
Antenor ria. Antenor tinha saúde. Todas aquelas desditas eram para ele brincadeira. Estava convencido de estar com a razão, de vencer. Mas, a razão sua, sem interesse chocava-se à razão dos outros ou com interesses ou presa à sugestão dos alheios. Ele via os erros, as hipocrisias, as vaidades, e dizia o que via. Ele ia fazer o bem, mas mostrava o que ia fazer. Como tolerar tal miserável? Antenor tentou tudo, juvenilmente, na cidade. A digníssima sua progenitora desculpava-o ainda.
— É doido, mas bom.
Os parentes, porém, não o cumprimentavam mais.
Antenor exercera o comércio, a indústria, o professorado, o proletariado. Ensinara geografia num colégio, de onde foi expulso pelo diretor; estivera numa fábrica de tecidos, forçado a retirar-se pelos operários e pelos patrões; oscilara entre revisor de jornal e condutor de bonde. Em todas as profissões vira os círculos estreitos das classes, a defesa hostil dos outros homens, o ódio com que o repeliam, porque ele pensava, sentia, dizia outra coisa diversa.
— Mas, Deus, eu sou honesto, bom, inteligente, incapaz de fazer mal...
— É da tua má cabeça, meu filho.
— Qual?
— A tua cabeça não regula.
— Quem sabe?
Antenor começava a pensar na sua má cabeça, quando o seu coração apaixonou-se. Era uma rapariga chamada Maria Antônia, filha da nova lavadeira de sua mãe. Antenor achava perfeitamente justo casar com a Maria Antônia. Todos viram nisso mais uma prova do desarranjo cerebral de Antenor. Apenas, com pasmo geral, a resposta de Maria Antônia foi condicional.
— Só caso se o senhor tomar juízo.
— Mas que chama você juízo?
— Ser como os mais.
— Então você gosta de mim?
— E por isso é que só caso depois.
Como tomar juízo? Como regular a cabeça? O amor leva aos maiores desatinos. Antenor pensava em arranjar a má cabeça, estava convencido.
Nessas disposições, Antenor caminhava por uma rua no centro da cidade, quando os seus olhos descobriram a tabuleta de uma "relojoaria e outros maquinismos delicados de precisão". Achou graça e entrou. Um cavalheiro grave veio servi-lo.
— Traz algum relógio?
— Trago a minha cabeça.
— Ah! Desarranjada?
— Dizem-no, pelo menos.
— Em todo o caso, há tempo?
— Desde que nasci.
— Talvez imprevisão na montagem das peças. Não lhe posso dizer nada sem observação de trinta dias e a desmontagem geral. As cabeças como os relógios para regular bem...
Antenor atalhou:— E o senhor fica com a minha cabeça?
— Se a deixar.
— Pois aqui a tem. Conserte-a. O diabo é que eu não posso andar sem cabeça...
— Claro. Mas, enquanto a arranjo, empresto-lhe uma de papelão.
— Regula?
— É de papelão! explicou o honesto negociante. Antenor recebeu o número de sua cabeça, enfiou a de papelão, e saiu para a rua.
Dois meses depois, Antenor tinha uma porção de amigos, jogava o pôquer com o Ministro da Agricultura, ganhava uma pequena fortuna vendendo feijão bichado para os exércitos aliados. A respeitável mãe de Antenor via-o mentir, fazer mal, trapacear e ostentar tudo o que não era. Os parentes, porem, estimavam-no, e os companheiros tinham garbo em recordar o tempo em que Antenor era maluco.
Antenor não pensava. Antenor agia como os outros. Queria ganhar. Explorava, adulava, falsificava. Maria Antônia tremia de contentamento vendo Antenor com juízo. Mas Antenor, logicamente, desprezou-a propondo um concubinato que o não desmoralizasse a ele. Outras Marias ricas, de posição, eram de opinião da primeira Maria. Ele só tinha de escolher. No centro operário, a sua fama crescia, querido dos patrões burgueses e dos operários irmãos dos spartakistas da Alemanha. Foi eleito deputado por todos, e, especialmente, pelo presidente da República — a quem atacou logo, pois para a futura eleição o presidente seria outro. A sua ascensão só podia ser comparada à dos balões. Antenor esquecia o passado, amava a sua terra. Era o modelo da felicidade. Regulava admiravelmente.
Passaram-se assim anos. Todos os chefes políticos do País do Sol estavam na dificuldade de concordar no nome do novo senador, que fosse o expoente da norma, do bom senso. O nome de Antenor era cotado. Então Antenor passeava de automóvel pelas ruas centrais, para tomar pulso à opinião, quando os seus olhos deram na tabuleta do relojoeiro e lhe veio a memória.
— Bolas! E eu que esqueci! A minha cabeça está ali há tempo... Que acharia o relojoeiro? É capaz de tê-la vendido para o interior. Não posso ficar toda vida com uma cabeça de papelão!
Saltou. Entrou na casa do negociante. Era o mesmo que o servira.
— Há tempos deixei aqui uma cabeça.
— Não precisa dizer mais. Espero-o ansioso e admirado da sua ausência, desde que ia desmontar a sua cabeça.
— Ah! fez Antenor.
— Tem-se dado bem com a de papelão?
— Assim...
— As cabeças de papelão não são más de todo. Fabricações por séries. Vendem-se muito.
— Mas a minha cabeça?
— Vou buscá-la.
Foi ao interior e trouxe um embrulho com respeitoso cuidado.
— Consertou-a?
— Não.
— Então, desarranjo grande?
O homem recuou.
— Senhor, na minha longa vida profissional jamais encontrei um aparelho igual, como perfeição, como acabamento, como precisão. Nenhuma cabeça regulará no mundo melhor do que a sua. É a placa sensível do tempo, das idéias, é o equilíbrio de todas as vibrações. O senhor não tem uma cabeça qualquer. Tem uma cabeça de exposição, uma cabeça de gênio, hors-concours.
Antenor ia entregar a cabeça de papelão. Mas conteve-se.
— Faça o obséquio de embrulhá-la.
— Não a coloca?
— Não.
— V.EX. faz bem.
Quem possui uma cabeça assim não a usa todos os dias. Fatalmente dá na vista.
Mas Antenor era prudente, respeitador da harmonia social.
— Diga-me cá. Mesmo parada em casa, sem corda, numa redoma, talvez prejudique.
— Qual! V.EX. terá a primeira cabeça.
Antenor ficou seco.
— Pode ser que V., profissionalmente, tenha razão. Mas, para mim, a verdade é a dos outros, que sempre a julgaram desarranjada e não regulando bem. Cabeças e relógios querem-se conforme o clima e a moral de cada terra. Fique V. com ela. Eu continuo com a de papelão.
E, em vez de viver no País do Sol um rapaz chamado Antenor, que não conseguia ser nada tendo a cabeça mais admirável — um dos elementos mais ilustres do País do Sol foi Antenor, que conseguiu tudo com uma cabeça de papelão.

João do Rio foi o pseudônimo mais constante de João Paulo Emílio Coelho Barreto, escritor e jornalista carioca, que também usou como disfarce os nomes de Godofredo de Alencar, José Antônio José, Joe, Claude, etc., nada ou quase nada escrevendo e publicando sob o seu próprio nome. Foi redator de jornais importantes, como "O País" e "Gazeta de Notícias", fundando depois um diário que dirigiu até o dia de sua morte, "A Pátria". Contista romancista, autor teatral (condição em que exerceu a presidência da Sociedade Brasileira de Autores Teatrais, tradutor de Oscar Wilde, foi membro da Academia Brasileira de Letras, eleito na vaga de Guimarães Passos. Entre outros livros deixou "Dentro da Noite", "A Mulher e os Espelhos", "Crônicas e Frases de Godofredo de Alencar", "A Alma Encantadora das Ruas", "Vida Vertiginosa", "Os Dias Passam", "As religiões no Rio" e "Rosário da Ilusão", que contém como primeiro conto a admirável sátira "O homem da cabeça de papelão". Nascido no Rio de Janeiro a 05 de agosto de 1881, faleceu repentinamente na mesma cidade a 23 de junho de 1321.
O texto acima foi extraído do livro "Antologia de Humorismo e Sátira", organizada por R. Magalhães Júnior, Editora Civilização Brasileira — Rio de Janeiro, 1957, pág. 196.

quinta-feira, abril 26, 2007

Conjugando...


Já não é novidade para meus vistantes, o meu encantamento por palavras bem trabalhadas (ou "brincadas"?)...Esta jóia me foi apresentada por um amigo que sofre do mesmo mal...é o meu amigo que se encanta com palavras, com belezas de dentro, com orquídeas; vibra com as conquistas de suas lindas crias, faz poesia pra sua Helena; pode chorar de felicidade ou diante de uma injustiça; ensinou-me a usar a "cabeça de papelão" (motivo pra uma próxima postagem) e sabe bem o que guardam minhas gavetas...

Sobre o autor, preciso descobrir mais...






Como se conjuga um empresário

(Mino - escritor cearense)



Acordou. Levantou-se. Aprontou-se. Lavou-se. Barbeou-se. Enxugou-se. Perfumou-se. Lanchou. Abraçou. Beijou. Saiu. Entrou. Cumprimentou. Orientou. Controlou. Advertiu. Chegou. Desceu. Subiu. Entrou. Cumprimentou. Assentou-se. Preparou-se. Examinou. Leu. Convocou. Leu. Comentou. Interrompeu. Leu. Despachou. Conferiu. Vendeu. Vendeu. Ganhou. Ganhou. Ganhou. Lucrou. Lucrou Lucrou. Lesou. Explorou.Escondeu. Burlou. Safou-se. Comprou. Vendeu. Assinou. Sacou. Depositou. Depositou. Depositou. Associou-se. Vendeu-se. Entregou. Sacou. Depositou. Despachou. Repreendeu. Suspendeu. Demitiu. Negou. Explorou. Desconfiou. Vigiou. Ordenou.Telefonou. Despachou. Esperou. Chegou. Vendeu. Lucrou. Lesou. Demitiu. Convocou. Elogiou. Bolinou. Estimulou. Beijou. Convidou. Saiu. Chegou. Despiu-se. Abraçou. Deitou-se. Mexeu. Gemeu. Fungou. Babou. Antecipou. Frustrou. Virou-se. Relaxou-se. Envegonhou-se. Presenteou. Saiu. Despiu-se. Dirigiu-se. Chegou. Beijou. Negou. Lamentou. Justificou-se. Dormiu. Roncou.Sonhou. Sobressaltou-se. Acordou. Preocupou-se. Temeu. Suou. Ansiou. Tentou. Despertou. Insistiu. Irritou-se. Temeu. Levantou. Apanhou. Rasgou. Engoliu. Bebeu. Rasgou. Engoliu. Bebeu. Dormiu. Dormiu. Dormiu. Acordou. Levantou-se. Aprontou-se...

sábado, abril 21, 2007

Brasilha



" Brasília cinqüenta anos – do abstrato de um sonho ao real do concreto."


Palavrinhas que me renderam o belo troféu aí da foto. É uma escultura de Omar Franco, oferecida pelo Correio Braziliense ao vencedor do concurso em que foi escolhida uma frase comemorativa aos cinqüenta anos de Brasília. Gostaram da minha frase e gostei do prêmio. É instigante falar dessa cidade, ilha de sonhos cercada de gente por todos os lados, gente de todos os cantos, de todas as línguas. Brotaram também estas outras palavrinhas:




Brasiliamamos
(Vilma Santos)

Brasília, azul do céu de mar ausente
Brasília, magenta do céu de sol poente
Brasília do sotaque não-sotaque de toda a gente
Brasília das não-esquinas, gelada e quente

Brasília de tesourinhas não cortantes
De curvas insinuantes
De retas largas
Superquadras...

Brasília do lago
Brasília das Asas
Dos altos planos
Do Plano Piloto
Pedra rara do Planalto...
Brasília candanga
Brasília satélite
Jovem senhora
Cinqüenta anos de sonho concreto.
Brasilio,
Brasilia,
Brasiliamamos.

segunda-feira, abril 09, 2007


Muito interessante, o texto abaixo transcrito, publicado ontem no Correio Braziliense, na coluna Dicas de Português de Dad Squarisi. Presenciei um desses testes nos meus tempos de estudante, é muito engraçado!

PELO TELEFONE

“ Conhece o teste do telefone? Um grupo de pessoas se senta ao lado uma da outra. A primeira lê uma história. A segunda, sem ler, cochicha a narrativa no ouvido do vizinho. A terceira faz o mesmo. E, assim sucessivamente. O resultado é espantoso. O último texto não tem nem parentesco com o primeiro. Quer um exemplo?

O presidente fez este pedido ao diretor:
Na próxima sexta-feira, às 17h, o cometa Halley passará por esta área. Trata-se de um evento que ocorre a cada 78 anos. Assim, por favor, reúna os funcionários no pátio da fábrica, todos usando capacete de segurança, quando explicarei o fenômeno. Se chover, não veremos o raro espetáculo a olho nu.

O diretor, obediente, passou este recado a gerente:
A pedido do presidente, na sexta-feira, às 17h, o cometa Halley vai aparecer sobre a fábrica. Se chover, por favor, reúna os funcionários, todos com capacete, e os encaminhe ao refeitório, onde o raro fenômeno terá lugar, o que ocorre a cada 78 anos a olho nu.

O gerente transmitiu esta informação ao supervisor:
A convite do nosso querido presidente, o cientista Halley, de 78 anos, vai aparecer nu na fábrica, usando apenas capacete, quando vai explicar o fenômeno da chuva para os seguranças do pátio.

O supervisor, por sua vez, mandou esta mensagem ao chefe:
Todo mundo nu, na próxima sexta-feira, às 17h, pois o mandachuva do presidente, Sr. Halley estará lá para mostrar o raro filme Dançando na chuva. Caso comece a chover mesmo, o que ocorre a cada 78 anos, por motivo de segurança coloque o capacete.

O chefe repassou o convite para os operários:
Nesta sexta-feira, o presidente fará 78 anos. A festa será às 17h, no pátio da fábrica. Vão estar lá Bill Halley e seus Cometas. Todo mundo deve estar nu e de capacete. O espetáculo vai rolar mesmo que chova porque a banda é um fenômeno.

Moral da história: as palavras, principalmente as faladas, são pra lá de levianas. Traem. A gente pensa que diz uma coisa, o ouvinte entende outra, e a coisa propriamente dita desconfia que não foi dita...”


terça-feira, abril 03, 2007

Reencanto


REENCANTO
(Vilma Santos)


Num ponto de espera ou
no ponto final ?
Enquanto não abre,
ou depois do sinal ?
Em qual rua, em que lua?
Nova mente crescente?
Quarto escuro ou minguante?
Em que plano, em que esfera?
Em qual era, em que aura?
Não sei!

Se veio, não vi
Ou bem te vi e se foi?
Ou virá quando ouvir
Cantar a sabiá?

Se vier saberá
Sem nada indagar
Que sou “quem” relativa
Sou “a” definida
Abstrata e concreta
Substantiva,
Adjetiva
Subjetiva
Objetiva e direta
Sou clara e obscura
O que enxerga a retina
E seu olho não vê.

Se vier saberei!...
Seu olhar de cristal
Vê detrás do espelho
Minha alma lavada
Na cara estampada.
Se vier, saberei...