quinta-feira, março 29, 2007

Vôo Solo


Vôo Solo

Disse Tom, que é impossível SER feliz sozinho...Talvez. Mas, se felicidade é um estado, é mais viável, ESTAR feliz. Há tanta coisa que me deixa feliz sozinha! Uma manhã de sol , céu “azul escândalo”, nuvem branca ou dourada, estrela cadente, sol nascente ou poente, lua cheia, nova ou crescente, grama orvalhada entre os dedos, botão de flor se abrindo, cantiga de passarinho, vento no bambuzal, silêncio total, dança de borboleta, bater de asas, queda dágua, espuma de onda, conchinha na areia, pedrinhas, chuva no telhado, um belo filme, um bom livro, uma canção suave, lavanda e alecrim, tomate com manjericão, macarrão quatro queijos, peixe no prato, vinho tinto seco merlot, bombom Ferrero Rocher, chocolate com menta, malas prontas pra viagem.

É, viajar sozinha, por que não? Muitas vezes viajei só, mas sempre havia alguém a minha espera. Dessa vez fui comigo mesma ao encontro de ninguém. Poderia escolher um “pacote”, ir de avião. Mas queria saber como anda a envergadura das minhas asas e minha capacidade de sobreviver só. Então, mãos à massa: escolher destino, hotel, o que fazer, onde comer, reduzir a bagagem ao estritamente necessário. Pantanal estava nos meus planos de outros carnavais e não é porque o vento mudou de direção que vou arriar as velas.
Primeiro inconveniente de viajar sozinha é não saber quem vai ocupar o assento ao lado e quase sempre é uma criatura espaçosa, com as pernas maiores que a cadeira e a cabeça pendente que insiste em cair no nosso ombro; por seis horas viajei em paz com minha janela, ninguém ao lado. Mas se era um teste de sobrevivência, não podia faltar a tal criatura...e veio um kit completo de grosseria; cheirava a álcool, despencou na cadeira feito um pacote, tirou os sapatos exalando gorgonzola, escancarou as pernas invadindo meu espaço. Fuzilei-o com um olhar que dizia tudo que precisava ouvir, baixei decididamente o braço separador das poltronas, fiz uma barreira com a bolsa que continha algumas coisinhas pontiagudas, enfiei os fones nos ouvidos, concentrei-me na paisagem voando pela janela e na música que não conseguia abafar o ronco da criatura que caiu em coma alcoólico e quatro horas depois desembarcou deixando-me em paz outra vez. Apesar disso, da precariedade das estradas e dos terminais rodoviários, por toda a beleza que conheci, voltaria ainda que de pau-de-arara. Meu vôo solo, acabou não sendo tão solo assim, pois como diz Dominguinhos, “amigos a gente encontra, o mundo não é só aqui...” No primeiro passeio estava com duas paulistas e onze alemães; no começo da manhã todo mundo isolado, cada um no seu canto...no fim da tarde eu já trocava informações com um casal alemão que mora no Rio Grande do Sul e despedi-me das paulistas com beijinhos e troca de e-mail; o taxista que deveria apenas me levar e buscar , tornou-se meu “guiamigo” nos dias seguintes. Decididamente, não estamos sós; para atrair gente basta descruzar os braços, olhar em volta e abrir ou entreabrir um sorriso, ainda que do tipo “Monalisa”, como dizem ser o meu. Já para atrair borboletas aprendi que é só fazer um “suco” de banana com água e açúcar e derramar no local onde se deseja tê-las; vou testar. E assim foi minha deliciosa aventura: acordar com uma orquestra de aves, ter a companhia de sanhaço azul no café da manhã, conviver com gente simples que desconhece o significado de muitas palavras, mas sabe perfeitamente o que é integridade e honestidade; gente que convive com bichos do mato como se fossem domésticos, respeitando e protegendo-os, gente que conhece a riqueza das matas pantaneiras que guardam verdadeiras farmácias: há plantas que servem de colírio, de antibiótico, de analgésico, de alimento; enfim num lugar onde não há médico, a mata resolve tudo.
É isso. Considero-me aprovada no teste: as asas, o GPS e o ímã pessoal funcionando direitinho. Aguardem-me cidades históricas de Minas, floresta amazônica, Fernando de Noronha, Campos do Jordão, Serras Gaúchas, Foz do Iguaçu, Machu Picchu, não necessariamente nessa ordem.

É possível sim estar feliz, sozinho; pelo menos, sozinha é.

À minha meia dúzia de visitantes, eis o meu novo álbum de fotos:

Um comentário:

Anônimo disse...

Bom dia Princesa! Seja bem vinda! Estou feliz com sua experiência, o ônibus, a criatura que creio não estava em seu estado normal, os companheiros de viagem, os amigos que fizeste, as trocas de e-mail, a paisagem, enfim, o que me deixou mas feliz foi saber que descobriu que é sim possível ser feliz sozinha. Tudo é aprendizado, sempre crescemos com estas aventuras. Muitos discordam quando digo que sou feliz sozinha, apesar de que estou sempre rodeada de pessoas queridas, e nas "longas estradas da vida" sempre estamos acompanhados, nem que seja pela Mãe Natureza. Não consegui ver suas fotos. A Nilcien está mandando um grande beijo. Estou com muita saudade. Seja bem vinda amiga! Permite que eu a chame de "amiga"? Ficaria lisonjeada em ser sua amiga. Mil beijinhos. Até mais. Meraldina. " Dina "