quinta-feira, agosto 31, 2006

Auto-Retrato


Meu retratinho 3x4, instantâneo, momentâneo, deletável,
inspirado no Auto-Retrato de Mário Quintana

Às vezes me pinto lago
Às vezes queda dágua
Às vezes me pinto asa
casca, pétala, espinho, brasa
...


O Auto-Retrato
(Mário Quintana)

No retrato que me faço
- traço a traço -
às vezes me pinto nuvem,
às vezes me pinto árvore...
às vezes me pinto coisas
de que nem há mais lembrança...
ou coisas que não existem
mas que um dia existirão...

e, desta lida, em que busco
- pouco a pouco -
minha eterna semelhança,

no final, que restará?
Um desenho de criança...
Corrigido por um louco!

quarta-feira, agosto 30, 2006

Vert


Vert
(
Vilma Santos)


Violetas na janela
Espera...
Ametista...
Violeta transparente
Lavanda
Lava a pele, lava a alma
Água morna
Cristal
Cristalina hialita
Calma
Vinhosanguetintoquente
“verde que te quero Vert”
que quero ver-te
verdes olhos
verdes pedras
esmeraldas...
azul de asas abertas
água marinha
água de mar
ia
vinha
espuma
branca de nuvem

Para ser grande, sê Inteiro


Para ser grande, sê inteiro
(Fernando Pessoa, sob o heterônimo de Ricardo Reis)
Para ser grande, sê inteiro: nada
teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
no mínimo que fazes
Assim em cada lago a lua toda
brilha, porque alta vive

O Silêncio é Ouro


Se "ouvíssemos" mais as atitudes que as palavras, cometeríamos menos enganos. Diz minha querida mãe que falar é prata, mas calar é ouro.
O silêncio me agrada, me acolhe, me ensina. Quando ainda não me conhecia bem, por vezes achava-me idiota por não ter o que falar...hoje sinto-me feliz por não ter vontade nem necessidade de falar...
Eis algumas pérolas sobre o silêncio: (De algumas deixei de citar o autor porque desconheço)


"Em determinadas situações o silêncio é a melhor resposta."

"Se uma fala não é mais bonita do que o silêncio, então é preferível nada dizer"

" As verdadeiras palavras nem sempre são bonitas, mas as palavras bonitas nem sempre são verdades."

"São necessários apenas dois anos para que o ser humano aprenda a falar e toda uma vida para que aprenda a ficar em silêncio."

"Arrependo-me muitas vezes de ter falado; nunca de ter silenciado." (Ciro)

"Muitas coisas não merecem ser ditas e muitas pessoas não merecem que as outras coisas lhe sejam ditas: o resultado é muito silêncio." (Henri Montherlant)

"O silêncio é mais eloqüente que as palavrs." (Carlile)

"O silêncio é um dos argumentos mais difíceis de refutar." (Josh Billings)

"O silêncio que ninguém ouviu, foi a primeira coisa que se viu." (Arnaldo Antunes)





segunda-feira, agosto 28, 2006

A Fada Azul

Não sei o que está havendo...posto um texto em forma de poesia, tudo certinho, e é exibido assim, todo misturado...quando tento editar, para mim aparece da forma correta, como se nada houvesse a corrigir, então fazer o quê né? Mas formas á parte, vamos ao que interessa...Sempre admirei o trabalho de Oswaldo Montenegro, um fascinado, como eu, pelo azul e pela lua...Esta jóia, porém eu não conhecia...recebi de presente, com a carinhosa dedicatória: "A você, que faz de azul mais que cor, sentimento, o retrato de sua alma"... fiquei muito feliz, por saber que ainda há quem tente enxergar almas...senti-me "desencasulada" azul e alada outra vez! Obrigada, linda cabeça pensante! Descobri que no site oficial do cantor, há muita coisa que é parte de peças de teatro, mas não foi publicada em CD, esta é uma delas.

A Fada Azul
(Oswaldo Montenegro)
Ela dança as fases da lua
tece vento e o ar rodopia
põe no colo os bichos das ruas
põe no chão quem quer correria
põe as mãos de alguém entre as suas
e é o nascer de um sol, mais um dia
Do aroma rosa da arte ela extrai a cor da alegria
do lilás do olhar de quem parte faz o azul de quem ficaria
do vermelho ardor do estandarte o nascer de um sol, mais um dia
Tem a solidão do poeta
a paixão da chuva tardia
escultora da linha reta
que a luz percorre e esta via
salta do seu olho, é uma seta
o nascer do sol, mais um dia
São brilhos de estrelas na perna
e a noite que a estrela anuncia
a paixão é estranha caverna
quem tem medo e amor já sabia
uma noite nunca é eterna
é o nascer do sol, mais um dia
Ela pisa as ruas do tempo
já foi louca, princesa e Maria
faz de azul mais que cor, sentimento
mina d'água, azul, poesia
faz soar as rimas que invento
e é o nascer do sol, mais um dia

quarta-feira, agosto 23, 2006

"Vamo Brincá de Azul?"


Andei um tempão à procura dessa crônica, que considero uma pérola dessa "irreverente senhora" que desliza suave do escracho de "todo mundo mijando a céu aberto" à doçura da poesia de "vamo brincá de azul"...
Tô Só
Crônica de Hilda Hilst para o "Correio Popular" de Campinas-SP


Vamo brincá de ficá bestando e fazê um cafuné no outro e sonhá que a gente enricô e fomos todos morar nos Alpes Suíços e tamo lá só enchendo a cara e só zoiando? Vamo brincá que o Brasil deu certo e que todo mundo tá mijando a céu aberto, num festival de povão e dotô? Vamo brincá que a peste passô, que o HIV foi bombardeado com beagacês, e que tá todo mundo de novo namorando? Vamo brincá de morrê, porque a gente não morre mais e tamo sentindo saudade até de adoecê? E há escola e comida pra todos e há dentes na boca das gentes e dentes a mais, até nos pentes? E que os humanos não comem mais os animais, e há leões lambendo os pés dos bebês e leoas babás? E que a alma é de uma terceira matéria, uma quântica quimera, e alguém lá no céu descobriu que a gente não vai mais pro beleléu? E que não há mais carros, só asas e barcos, e que a poesia viceja e grassa como grama (como diz o abade), e é porreta ser poeta no Planeta? Vamo brincá
de teta
de azul
de berimbau
de doutora em letras?
E de luar? Que é aquilo de vestir um véu todo irisado e rodar, rodar...
Vamo brincá de pinel? Que é isso de ficá loco e cortá a garganta dos otro?
Vamo brincá de ninho? E de poesia de amor?
nave
ave
moinho
e tudo mais serei
para que seja leve
meu passo
em vosso caminho.
Vamo brincá de autista? Que é isso de se fechá no mundão de gente e nunca mais ser cronista? Bom-dia, leitor. Tô brincando de ilha...

terça-feira, agosto 22, 2006

A Verdade Dividida


Quanta beleza e sabedoria! Qual de nós não é míope quando trata da própria verdade?
A Verdade Dividida
(Carlos Drummond de Andrade)
A porta da verdade estava aberta
mas só deixava passar
meia pessoa de cada vez.
Assim não era possível atingir toda a verdade,
porque a meia pessoa que entrava
só conseguia o perfil de meia verdade.
E sua segunda metade
voltava igualmente com meio perfil.
E os meios perfis não coincidiam.
Arrebentaram a porta.
Derrubaram a porta.
Chegaram ao lugar luminoso
onde a verdade esplendia os seus fogos.
Era dividida em duas metades
diferentes uma da outra.
Chegou-se a discutir qual a metade mais bela.
Nenhuma das duas era perfeitamente bela.
E era preciso optar. Cada um optou
conforme seu capricho, sua ilusão, sua miopia.

O Homem e a Luz


“ O homem não foi feito para ver a luz, mas para ver as coisas por ela iluminadas.”
(Goethe)

quinta-feira, agosto 17, 2006

Imitações


Em tempos de essência ausente, vivam os arremedos!
A Imitação do Amanhecer
(Bruno Tolentino)

Para encontrar em cada coisa a pura essência,
Há que dispor primeiro de tudo que a sustente:
Do fruto há que excluir a morte da semente,
A parte da agonia na febre da existência.
Da arte há que reter tão-só a ambivalência;
De um corpo, a sombra apenas de tudo o que ele sente;
Mas do amor, sobretudo a ambição mais doente:
A estátua modelar a partir de uma ausência...
Ora, se a ausência é tida como constitutiva,
Que alternativa, que saída resta ao ser,
A não ser esculpir-se um falso amanhecer...?
Certo poeta, que chamou de ausência viva
Esse mármore amargo, arriscou-se a perder,
Não a trocar o amor por uma estátua altiva.

quarta-feira, agosto 16, 2006

Se tá longe, alcance!


Este sabe brincar com palavras!
Isso me fascina!
Do it
(Lenine)
Ta cansada senta
Se acredita tenta
Se tá frio esquenta
Se tá fora entra
Se pediu agüenta
Se sujou cai fora
Se da pé namora
Ta doendo chora
Ta caindo escora
Não tá bom melhora
Se aperta grite
Se tá chato agite
Se não tem credite
Se foi falta apite
Se não é imite
Se é do mato amanse
Trabalhou descanse
Se tem festa dance
Se tá longe alcance
Use sua chance
Se tá puto quebre
Ta feliz requebre
Se venceu celebre
Se ta velho quebre
Corra atrás da lebre
Se perdeu procure
Se é seu segure
Se tá mal se cure
Se é verdade jure
Quer saber apure
Se sobrou congele
Se não vai cancele
Se é inocente apele
Escravo se rebele
Nunca se atropele
Se escreveu remeta
Engrossou se meta
Quer dever prometa
Pra moldar derreta
Não se submeta

terça-feira, agosto 15, 2006

Caliandra, minha rainha!


Tão bela quanto simples... bela até no nome!
Caliandra, minha rainha do cerrado, floquinho de lembranças puras.

"Seu" João


“Seu” João

Seu João Galego, Seu João Vermelho, Seu João Pedreiro, Seu João Ferreira, Seu João de Dona Valda...Seu João, meu pai...
Homem de pouco riso e muito siso, de pouca palavra e muita atitude; Seu João era muito trabalho e pouco dinheiro; não dava presente, era presença, apesar do pouco tempo; ensinava a sonhar e a cultivar sonho; Não achava graça em flor, mas se dava o trabalho de colher uma para a menininha magrela que carinhosamente chamava de “minha moleca véia”, “canela de sibita”, “olho de pitomba lambida”...Se ia nadar, trazia entre os dentes um nenúfar, que colhia das águas ou um malmequer da margem do rio; quando Brasília ainda era um enorme canteiro de obras, ao voltar do trabalho, tinha de atravessar bom pedaço de cerrado, de onde trazia uma caliandra protegida num lenço.
Seu João era carrancudo, falava pouco e pensava muito; era um diamante não lapidado.
Tinha mãos lindas, mãos de artista, que deslizavam em traços finos de desenho, transformavam-se em bichos de sombra na parede para me divertir, penteavam suavemente meus cabelos e se feriam no duro dia-a-dia de pedreiro...Seu João não escolhia trabalho; desde que honesto, fazia o que fosse preciso para cumprir o dever de provedor.
No último domingo, Dia dos Pais, vi muitas declarações de filhos, sobre o que aprenderam com os pais...com o meu, aprendi a valorizar a família, que é o nosso abrigo quando falha tudo o mais.
Aprendi que a verdade, prevalece; nunca vi em seus claros olhos verdes qualquer sombra de mentira ou de motivo para desconfiança.
Aprendi que não devo fazer ao outro o que não quero que façam comigo.
Seu João já foi para um plano de luz , mas ainda me mostra o caminho e segura minha mão na hora da incerteza.
Obrigada, meu pai!

segunda-feira, agosto 14, 2006

Deixa entrar o sol!


Noites Com Sol
(Flávio Venturini)

Ouvi dizer que são milagre
Noites com sol
Mas hoje eu sei não são miragem
Noites com sol
Posso entender o que diz a rosa
Ao rouxinol
Peço um amor que me conceda
Noites com sol

Onde só tem o breu
Vem me trazer o sol
Vem me trazer amor
Pode abrir a janela
Noites com o sol e neblinas
Deixa rolar nas retinas
Deixa entrar o sol

Livre serás se não te prendem
Constelações
Então verás que não se vendem
Ilusões
Vem que eu estou tão só
Vamos fazer amor
Vem me trazer o sol
Vem me livrar do abandono
Meu coração não tem dono
Vem me aquecer nesse outono
Deixa entrar o sol

Pode abrir a janela
Noites com sol são mais belas
Certas canções são eternas
Deixa o sol entrar

sábado, agosto 12, 2006

Feliz Aniversário!


Há 22 anos ganhei um presente que me pôs no futuro...Não dei à luz um bebê, um bebê deu-me a luz...nunca mais fui singular; ao me dividir, multipliquei-me e passei a plural...Há quem diga que ser mãe é padecer no paraíso, para mim tem sido agradecer ao paraíso.
Pelo privilégio de ter abrigado em mim, uma semente de luz que veio me ensinar a crescer, agradeço à Vida!
Feliz Aniversário, filho meu!

quinta-feira, agosto 10, 2006

A MAR ELO


A MAR ELO
(Vilma Santos)

A maré leva e traz
Amar é espera
Ama é elo
Amarelo é o sol
Que quebra o gelo
Que abre a semente
Que brota a flor
A flor amarela do girassol
A flor amarela do ipê
Que amarela o chão
Que parece cama
Que chama
O que a maré leva
O que a maré traz...

Lua

(Lua colhida hoje cedinho)
Lua Branca
(Vilma Santos)
Lua de Montenegro,
Lua de Clara e de Clarice,
Lua de Tom e de Vinícius,
de Cecília e de Drummond,
Lua de Chico e de Chiquinha
Lua do “Anjo Malaquias”
Lua de Mários e Marias,
de Marília e de Dirceu...
Lua dos poetas e loucos,
dos boêmios, dos amantes...
Lua cantada em prosa e verso
tão rainha quanto a rosa...
lua mística, lua nova,
lua cheia de mistérios,
crescente em quarto minguante...
lua branca, lua de prata,
lua de mel, lua de fel,
meia lua, lua nua,
lua minha, lua tua...


A você, dias de branca lua e noites ensolaradas!

quarta-feira, agosto 09, 2006

Os Filhos


Os Filhos
(Do Livro "O Profeta" de Gibran Khalil Gibran)


Vossos filhos não são vossos filhos.
São os filhos e as filhas da ânsia da vida por si mesma.
Vêm através de vós, mas não de vós.
E embora vivam convosco, não vos pertencem.
Podeis outorgar-lhes vosso amor, mas não vossos pensamentos,
Porque eles têm seus próprios pensamentos.
Podeis abrigar seus corpos, mas não suas almas;
Pois suas almas moram na mansão do amanhã,
Que vós não podeis visitar nem mesmo em sonho.
Podeis esforçar-vos por ser como eles, mas não procureis fazê-los como vós,
Porque a vida não anda para trás e não se demora com os dias passados.
Vós sois os arcos dos quais vossos filhos são arremessados como flechas vivas.
O arqueiro mira o alvo na senda do infinito e vos estica com toda a sua força
Para que suas flechas se projetem, rápidas e para longe.
Que vosso encurvamento na mão do arqueiro seja vossa alegria:
Pois assim como ele ama a flecha que voa,
Ama também o arco que permanece estável.


A Resposta


A Resposta
(Vilma Santos)
Entre mil formas e cores
entre dores e amores
acima do azul
ou debaixo das águas
além dos risos
ou por trás das mágoas
deve estar, tem de estar
a chave da grade
o xis da questão
a resposta à pergunta
o desvendar do mistério
O porquê dos por quês
o encontro das linhas
o encaixe dos pontos.

terça-feira, agosto 08, 2006

Deixa Cair!


"Qualquer esforço para se agarrar um objeto em queda, provoca mais destruição do que se o deixássemos cair naturalmente."
Desconheço o autor...mas que é uma grande verdade, é! E vale também para coisas-não-coisas...Reflitamos!

Tu e Eu




Gostei muito deste poema, pelo delicioso joguinho de palavras (eu, calipto, tu, lipa)...aliás, palavras são divertido brinquedo, mas deveria haver exceção para umas que considero sagradas: “Eu te Amo”...essas só deveriam ser ditas quando saídas do coração, mas infelizmente a grande maioria sai de pontos abaixo do umbigo e são jogadas ao vento.

Tu e Eu
(Luís Fernando Veríssimo)

Somos diferentes, tu e eu.
Tens forma e graça
e a sabedoria de só saber crescer
até dar pé.
E não sei onde quero chegar
e só sirvo para uma coisa
- que não sei qual é!
És de outra pipa
e eu de um cripto.
Tu, lipa
Eu, calipto.

Gostas de um som tempestade
roque lenha
muito heavy
Prefiro o barroco italiano
e dos alemães
o mais leve.
És vidrada no Lobão
eu sou mais albônico.
Tu, fão.
Eu, fônico.

És suculenta
e selvagem
como uma fruta do trópico
Eu já sequei
e me resignei
como um socialista utópico.
Tu não tens nada de mim
eu não tenho nada teu.
Tu, piniquim.
Eu, ropeu.

Gostas daquelas festas
que começam mal e terminam pior.
Gosto de graves rituais
em que sou pertinente
e, ao mesmo tempo, o prior.
Tu és um corpo e eu um vulto,
és uma miss, eu um místico.
Tu, multo.
Eu,carístico.

És colorida,
um pouco aérea,
e só pensas em ti.
Sou meio cinzento,
algo rasteiro,
e só penso em Pi.
Somos cada um de um pano
uma sã e o outro insano.
Tu, cano.
Eu, clidiano.

Dizes na cara
o que te vem a cabeça
com coragem e ânimo.
Hesito entre duas palavras,
escolho uma terceira
e no fim digo o sinônimo.
Tu não temes o engano
enquanto eu cismo.
Tu, tano.
Eu, femismo.


segunda-feira, agosto 07, 2006

Assovio


Assovio

(Cecília Meireles)

Ninguém abra a sua porta
Para ver o que aconteceu:
Saímos de braço dado
A noite escura mais eu.

Ela não sabe o meu rumo,
Eu não lhe pergunto o seu:
Não posso perder mais nada,
Se o que houve já se perdeu.

Vou pelo braço da noite,
Levando tudo que é meu:
- a dor que os homens me deram,
e a canção que Deus me deu.

Recomeça!!!


Porque poemas e flores são doces e porque cada acordar é um recomeço...

"Não te deixes destruir...
Ajuntando novas pedras
e construindo novos poemas.
Recria tua vida, sempre, sempre.
Remove pedras e planta roseiras e faz doces.
Recomeça.
Faz de tua vida mesquinha um poema."

(Trecho do poema "Aninha e suas pedras" de Cora Coralina, a "Senhora da Casa da Ponte" )

sexta-feira, agosto 04, 2006

Mãos


Mãos
(Vilma Santos)

De mãos postas, peço aos céus
que mãos erguidas agradeçam
pela vida de outras mãos
que vão à obra, cavam o chão,
lançam sementes, colhem grãos,
preparam o pão, dão de comer...

De mãos postas peço aos céus
que mãos impostas curem
dores do corpo e da alma...
que mãos derrubem muros e ergam abrigos,
acendam a chama, afastem trevas
celebrem a paz e levem calma...

De mãos postas, peço aos céus,
Que não haja tantas mãos
em vão estendidas, á espera da sorte
de ter uma migalha e algum agasalho...
Que não haja tantas mãos
crispadas de ódio, manchadas de morte...

De mãos dadas com quem amo,
Peço aos céus que nossas mãos
Sigam assim entrelaçadas...
Atadas, jamais!! unidas somente
Pela busca do prazer da harmonia,
de estar junto pelos laços do querer ...

Doce Cora

Cora Coralina (Ana Lins do Guimarães Peixoto Brêtas), nascida em 20 de agosto de 1889, é a grande poetisa do Estado de Goiás. Fez apenas os estudos primários, com a professora Silvina Ermelinda Xavier de Brito (Mestra Silvina), por volta de 1899 e 1901; Em 1903 já escrevia poemas sobre seu cotidiano, tendo criado, juntamente com duas amigas, em 1908, o jornal de poemas femininos "A Rosa”. Foi influenciada entre outros, por Almeida Garrett, Allan Kardec e Olavo Bilac.
Em 1980, tem seu trabalho reconhecido por Carlos Drummond de Andrade, o que a torna conhecida em todo o Brasil:Em 1983, Drummond manifesta por carta, sua admiração pela poetisa, referindo-se ao livro “Vintém de Cobre – Meias Confissões de Aninha”, muito bem recebido pela crítica e pelos amantes da poesia:
Minha querida amiga Cora Coralina: Seu "Vintém de Cobre" é, para mim, moeda de ouro, e de um ouro que não sofre as oscilações do mercado. É poesia das mais diretas e comunicativas que já tenho lido e amado. Que riqueza de experiência humana, que sensibilidade especial e que lirismo identificado com as fontes da vida! Aninha hoje não nos pertence. É patrimônio de nós todos, que nascemos no Brasil e amamos a poesia ( ...)."

Cora viveu 96 anos; morreu em Goiânia, em 10 de abril de 1985 e teve o corpo velado na Igreja do Rosário, ao lado da Casa Velha da Ponte, na cidade de Goiás.

As mãos que amassavam o pão, cultivavam rosas e faziam doces, escreviam maravilhas como esta:

Não Sei
(Cora Coralina)

Não sei... se a vida é curta
ou longa demais pra nós,
Mas sei que nada do que vivemos
tem sentido, se não tocamos o coração das pessoas.
Muitas vezes basta ser:
Colo que acolhe,
Braço que envolve,
Palavra que conforta,
Silêncio que respeita,
Alegria que contagia,
Lágrima que corre,
Olhar que acaricia,
Desejo que sacia,
Amor que promove.
E isso não é coisa de outro mundo,
é o que dá sentido à vida.
É o que faz com que ela
não seja nem curta,
nem longa demais,
Mas que seja intensa,
verdadeira, pura...
Enquanto durar."

quinta-feira, agosto 03, 2006

Nenúfares


Nenúfares

Sabe os nenúfares, aquelas sedutoras flores aquáticas? Há quem se ache esperto vendendo-as em vasinhos de terra; mas fora de seu ambiente e sem raízes, as belas murcham em pouquíssimo tempo...
Mesmo sabendo disso, há quem continue insistindo em enfeitar o jardim comprando e descartando nenúfares...
É que cultivar um jardim dá trabalho e exige paciência...há que se lançar a semente, esperar o broto, alimentar as raízes, aparar os liames, arrancar a erva daninha e aceitar o ciclo natural...virão os botões, as pétalas se abrirão, amadurecerão e fenecerão; voltarão à terra, fertilizando-a para um novo ciclo, pois nenhum botão será botão para sempre ...
Ainda que ferida pelos espinhos, prefiro meu jardim com raízes e liames...

Esperemos


Há dias de plantar e dias de colher, dias de rir e dias de chorar, dias de errar e dias de corrigir, então que venham muitos dias, pois como diz D. Pablo...

Esperemos
Pablo Neruda (Últimos Sonetos)
Há outros dias que não têm chegado ainda,
que estão fazendo-se
como o pão ou as cadeirasou o produto
das farmácias ou das oficinas
há fábricas de dias que virão
existem artesãos da alma
que levantam e pesam e preparam
certos dias amargos ou preciosos
que de repente chegam à porta
para premiar-nos
com uma laranja
ou assassinar-nos de imediato.

quarta-feira, agosto 02, 2006

A Hora do Nojo


Eu disse que usaria este espaço para falar de belezas e levezas da alma, mas às vezes, para a alma ficar leve, é preciso falar de coisas nada belas.
É a hora do macaco, do palhaço, do podre, do nojo!
Tudo outra vez! Sou obrigada a ver ruas poluídas por faixas, santinhos, cartazes, muros pintados com nomes de picaretas e seus slogans que infelizmente ainda enganam muita gente; tenho os ouvidos torturados pelos nauseantes jingles que me causam inveja dos surdos e ainda sou obrigada a votar... mas não sou obrigada a ajudar eleger, é o meu trunfo!
A mim não enganam mais seus sorrisos de crocodilo! abraçam velhinhas, pegam criancinhas no colo, comem marmita com operários e sentam-se com eles no chão para a foto de “igualdade”; empanturram-se de pastel de rodoviária, café com pão em padaria de bairro pobre; prometem o que todo mundo gostaria que fosse verdade e que nunca vão fazer! Exploram a miséria do desemprego, fazendo com que , até grávidas fiquem na rua abanando pesadas bandeiras a troco de alguns reais.
Não me enganam mais os berros histéricos da esquerda radical nem a fala mansa dos bons moços da direita que vieram de famílias humildes, formaram-se médicos mas em vez de salvar vidas, resolveram “lutar por um Brasil melhor”. Qualquer que receba o mandato do povo, usará o “Poder” em proveito próprio e dos “amigos do rei”, condenará o governo passado pelos erros e continuará cavando o enorme buraco que engole o povo.
Companheiros e companheiras, brasileiros e brasileiras, minha gente, O MEU VOTO NÃO!!!

A foto é detalhe de uma escultura, se não me engano de Siron Franco, exposta no Museu de Arte de Brasília em fevereiro/2006...Não sei bem em que o autor se inspirou, mas tenho a impressão de que foi em campanha eleitoral...

terça-feira, agosto 01, 2006

Água Sempre!

(Foto de Márcia Amélia)


O que somos na essência é imortal, é indestrutível...
Podemos nos perder pelo caminho, desperdiçar nossa estada neste plano,
mas somos luz e á luz voltaremos ainda que a duras penas;
assim como a água que pode ser represada, cristalizada, fervida, evaporada, ter seu curso desviado, ser absorvida pela terra sedenta, tornar-se nuvem ou neve, mas será sempre água .

Eu, passarinha


Nesse último fim-de-semana muito se falou de poesia, ou melhor, da poesia de Mário Quintana, poeta gaúcho que completaria 100 anos no dia 30 de julho.O Correio Braziliense publicou artigos muito interessantes sobre esse poeta, quando perguntado se nunca quisera ter casa, sempre respondia: “eu moro em mim mesmo”.
Érico Veríssimo o elogiou assim: “Descobri outro dia que o Quintana na verdade é um anjo disfarçado de homem. Às vezes quando ele se descuida ao vestir o casaco, suas asas ficam de fora. (Ah! Como anjo seu nome não é Mário e sim Malaquias”)

Só podia mesmo ser anjo, esse poeta que preferia a lua a qualquer droga e dizia coisas lindas assim:

“Ela (a lua) é a maconha dos poetas. A poesia deveria ser a dos leitores. As pessoas deviam se maconhar de poesia. Fariam, garanto, uma viagem muito mais interessante.”

“As estrelas e as flores são perguntas de Deus”

“Só a poesia possui as coisas vivas”

“Sempre me senti isolado nessas reuniões sociais: o excesso de gente impede de ver as pessoas...”

“ Se alguém te perguntar o que quiseste dizer com um poema, pergunte-lhe o que Deus quis dizer com este mundo.”

Quem não compreende um olhar, tampouco compreenderá uma longa explicação.
“O sorriso enriquece os recebedores sem empobrecer os doadores. “

E o eterno “Poeminha do Contra”

Todos esses que aí estão
Atravancando meu caminho,
Eles passarão...
Eu passarinho!

Por toda essa beleza e pelo poder de sedução dos títulos de alguns de seus trabalhos (A Rua dos Cataventos, Sapato Florido, Esconderijos do Tempo A Cor do Invisível), apaixonei-me, eu passarinha!