quarta-feira, janeiro 24, 2007

Mulher Velha


Há algum tempo ouvi um famoso dizer: “ No dia em que me olhei no espelho e disse a mim mesmo que era um homem velho, fiquei em paz !”


Eu sou uma mulher velha! E não foi o espelho que me disse, sempre soube. Revirando o baú dos guardados encontrei um caderno amarelado por 35 anos de existência com estas palavras:
“Achamos por bem destacar na disciplina Técnicas de Serviços, alguns assuntos orientados por nossa professora, trabalhos feitos com a máxima boa vontade e que julgamos, muito nos servirão no futuro bem próximo. Eis uma síntese do que aprendi”.... Isso não é linguagem de uma menina de 13 anos...logo fui uma adolescente velha. Daí voltei um pouco mais no tempo e vi uma molequinha de 3 anos choramingando pelos cantos da casa, morta de sono e cansaço de uma viagem nada confortável, se lamentando: “ a gente só é desenhada nesse mundo pra sofrer” Isso não é linguagem de criança dessa idade, então fui uma criança velha; mas deixa explicar o “gente desenhada”...desde sempre gosto de desenhar; pedia a minha mãe um lápis pra “fazer gente” e ela dizia: “não é fazer gente, é desenhar gente...daí entendi que gente era coisa desenhada. Hoje tenho certeza disso...tem gente desenhada a lápis, a pena de nanquim, a aquarela e a ferro e fogo. Mudei de assunto...tudo bem, isso também é coisa de gente velha que atinge um certo "descaramento" de falta de compromisso com o padrão, com os ponto e vírgulas com os pontos finais e que fica mais à vontade com aspas e reticências. Voltando ao que estava dizendo...Que é mesmo ser velho? Como diz o Ziraldo tem suas vantagens; pra catarata tem cirurgia, pra dor na coluna tem caminhada e o bom mesmo é poder entrar em qualquer lugar sem pegar fila...Em pouco menos de vinte anos terei essa “regalia”; as rugas ainda são poucas, os cabelos brancos ainda dá pra arrancar, se quiser; a lei da gravidade ainda não fez muito estrago, pois como diz Rita Lee, o bom de não ter bundona nem peitão é que também não tem nada pra cair. Mas por saber que há um bicho que não morre, uma chama que não dorme; por ter vivido o bastante para saber que rótulos de propriedade não ficam bem em gente, que para se ter a companhia de bichos de asas não se usa gaiola, enfeita-se o jardim; que sentimentos profundos não precisam de “outdoors” nem de megafones; que mentiras repetidas não se tornam verdades; que para que haja frutos maduros no outono é necessário o frescor do inverno, o calor do verão e o explodir da primavera; por saber que o amor não submete, não é submisso nem aceita condições ; por acreditar que ETERNO é apenas o ciclo de nascer, aprender (ou perder a oportunidade), voltar ao lar e renascer e que o resto é passageiro; por preferir a mansidão dos lagos ao turbilhão das quedas dágua, um longo trote a um cansativo galope, a calma do ocaso à incerteza do acaso é que eu digo serenamente: Espelho, espelho meu, não estou velha , SOU UMA MULHER VELHA!

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